quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Inadimplência na Terra do Nunca

Em sua coluna publicada em 22/12 no jornal Valor Econômico, a jornalista Monica Izaguirre chama atenção para a baixa inadimplência das instituições oficiais de crédito (link). Ela sugere que o crescimento destas instituições, que aumentaram drasticamente sua participação no mercado de crédito nos últimos anos, teria diferença fundamental com relação a ciclos anteriores de crédito fácil, que sistematicamente acabaram em tragédia e quebras destas instituições, cujas perdas precisaram ser bancadas pelo governo federal. O assunto é muito pertinente, mas a conclusão da jornalista infelizmente é oposta à realidade. Coincidência ou não, é exatamente aquela que os 'gestores da coisa pública' querem fazer valer.

Apesar de toda a melhoria na gestão pública - em particular no Banco do Brasil, que tem ações negociadas no Novo Mercado da Bovespa - os gestores dos bancos oficiais não ficaram mais inteligentes ou escrupulosos do que seus predecessores. O que está acontecendo é exatamente uma reprise do mesmo filme, com alguns enredos adicionais.


Primeiramente, há que se compreender que ainda estamos em momento de expansão de crédito. Nesta fase do ciclo, é extremamente improvável que taxas de inadimplência mostrem a real situação financeira dos tomadores de crédito. No fim do dia, a capacidade de pagamento dos tomadores depende da qualidade do uso que foi dado aos recursos. E aqui, como veremos, as evidências não são positivas.

Também é preciso levar em conta - como a própria jornalista já menciona - que os créditos oficiais são extremamente subsidiados, tornando-os os últimos que um empresário em dificuldade deixará de pagar. O valor de manter as torneiras da viúva abertas é alto demais.

A única mudança fundamental que está acontecendo é no paradigma de agressividade da gestão dos bancos oficiais. Cada vez mais vemos um uso intenso da flexibilidade das normas contábeis para adiar os problemas. O combustível principal para isso é a capacidade de colocar dinheiro bom em cima de dinheiro ruim, como comprovam as seguidas necessidades de capitalização das entidades oficiais de credito. Trata-se de numa evidente reedição da conta-movimento do Banco do Brasil, de triste memória.

O disclosure dos bancos oficiais não permite uma investigação independente que confirme a qualidade de seus ativos e a taxa de inadimplência divulgada. Mas basta olhar para alguns exemplos de grande porte para perceber que a sujeira embaixo do tapete é grande.

Por exemplo: qual o prejuízo registrado pela Caixa com o investimento no Banco Panamericano? Zero. Foi tudo pra baixo do tapete, com a conivência privada do FGC e um cheque em branco para financiar a finada casa bancária com uma linha de crédito de mais de R$10 bilhões da sua sócia estatal.

E qual é o prejuízo registrado pelo BNDES nos mega empréstimos aos frigorficos? Zero. Se as empresas tem dificuldade, nada que uma nova capitalização ou debênture não resolva.

E com a Lupatech, que tem investimentos de capital e de dívida do BNDES e de fundos de pensão estatais, e cujos títulos negociam a percentuais ridículos do seu valor de face? Zero. Aliás, somos brindados com mais um press release da Avenida Chile, confirmando que continuará "apoiando" a antiga metalúrgica que se reinventou como um dínamo da indústria do petróleo.



Se estes poucos casos já saltam aos olhos, o que não dizer das dezenas de milhares de operações de crédito outorgadas nos últimos anos pelo aparelho estatal ?

A verdade virá à tona, mais cedo ou mais tarde, e será dolorosa. Mas neste momento os gestores que abriram as torneiras já não estarão mais por aí, e o problema cairá no colo de outros. Exatamente como no ciclo anterior. Os prejuízos reconhecidos na gestão FHC foram cozinhados nas gestões populistas de seus antecessores. É sempre assim.


É fundamental que as instituições oficiais reduzam sua participação no mercado de crédito para menos da metade dos valores atuais. A redução dos subsídios e da dívida pública que elas alimentam abriria espaço para reduções na taxa Selic, que afeta os indivíduos e os empresários que não são ungidos pela proximidade do poder. Chega a hora de terminarmos com esta política de Robin Hood às avessas, por meio da qual nosso governo tributa a patuléia para beneficiar grandes empresários.

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